Solomon Radasky - Contando com a sorte para escapar do cerco ao Gueto de Varsóvia
- futurasgeracoes1
- Dec 2, 2016
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Nascido na cidade de Varsóvia, na Polônia, em maio de 1910, Solomon chegou a ter um comércio onde ele produzia e comercializava casacos de pele. Das 78 pessoas de sua família ele foi o único a sobreviver. Seus pais, Jacob e Toby tiveram 3 meninos e 3 meninas. Seus irmãos foram Moishe e Baruch, e suas irmãs eram Sarah, Rivka e Leah. Todos perderam suas vidas em função do Holocausto. Enquanto estava no gueto, ele trabalhava na produção de casacos de lã de carneiro para o exército alemão. Ele recorda-se que na última semana de janeiro de 1941 foi abordado por oficiais nazistas e policiais judeus do gueto. Aquele era um inverno muito frio, com muita neve e por isso ele foi forçado a trabalhar com outras pessoas na remoção de neve dos trilhos da ferrovia. O trabalho deles consistia em manter os trens operando. Ao retornar para o gueto, descobriu que sua mãe e sua irmã mais velha haviam sido assassinadas. Os alemães exigiram que os Judenrat recolhessem ouro e casacos de peles das pessoas do gueto. Quando sua mãe disse não possuir nenhum destes bens, então eles atiraram nela e em sua irmã mais velha. Seu pai foi morto em abril de 1942. Ele saiu para comprar pão com as crianças que contrabandeavam comida para o gueto. Um policial judeu delatou o senhor Jacob para um oficial alemão, que acabou por atirar nele pelas costas. As deportações começaram em 22 de julho de 1942. Suas duas irmãs e dois irmãos foram encaminhados para Treblinka. Depois disso, ele nunca mais voltou a ter contato com seus familiares. Certo dia um amigo disse para Solomon que viu uma das irmãs dele trabalhando na fábrica de Többens and Schultz, que fabricava uniformes para os nazistas. Ele queria muito vê-la, mas estava a alguns quilômetros de distância e não sabia como chegar lá. Um policial judeu disse que ele poderia conseguir um soldado alemão para lhe acompanhar até lá e lhe trazer de volta. Custaria 500 zlotys, o que era muito dinheiro, mas Solomon aceitou. O soldado o algemou e andou atrás dele com um rifle, como se estivesse escoltando um prisioneiro. Ao chegar no lugar combinado, ele não conseguiu encontrar sua irmã. Logo depois ele viu que estava preso na fábrica e não poderia voltar para o gueto, pois ele havia sido cercado pelos soldados alemães. A manhã do dia seguinte foi 19 abril de 1943, que foi quando a Revolta do Gueto de Varsóvia começou. No primeiro dia de maio, de 1943, Solomon foi baleado no tornozelo. A bala atravessou a carne, mas não bateu no osso. Logo depois ele foi levado para a praça em Varsóvia onde as pessoas eram enviadas aos campos de concentração. Inicialmente ele iria para Treblinka, mas como eles podiam receber até 10.000 pessoas por dia e em seu grupo tinham 20.000 judeus, parte das pessoas acabou então sendo encaminhada Majdanek, que era outro campo de extermínio. Em Majdanek os oficiais nazistas pegaram as roupas daqueles que estavam ingressando ao campo e lhes entregaram camisas listradas, calças e sapatos de madeira. Solomon foi enviado para o barracão 21. Ao deitar na cama ele se recorda de ser abordado por um homem mais velho que lhe perguntou como ele estava e disse que poderia ajudá-lo. Ele tinha sido um médico em Paris. Esse senhor tomou uma pequena faca de bolso e fez uma operação no tornozelo que havia sido ferido. Em um depoimento sobre este episódio, Solomon relembra: “Até hoje eu não entendo como ele poderia ter mantido uma faca no acampamento. Não havia medicamentos ou ligaduras. Ele disse: ‘Eu não tenho nenhuma medicação, você tem que ajudar a si mesmo. Quando você urinar, use parte da urina como antisséptico em sua ferida.’ Tínhamos que andar 3 km para o trabalho. Eu tive que me firmar em linha reta, sem mancar e caminhar portão afora do acampamento. Eu estava assustado. Se eu mancasse, eles iriam me levar para fora da fila. Em Majdanek eles lhe puniam por qualquer coisa. Eu não sabia como eu iria aguentar. Deus deve ter me ajudado, eu tive sorte!” Em outra ocasião, Solomon recorda-se em meio de uma das chamadas que costumavam fazer no campo, onde os presidiários eram forçados a caminhar e a ficar horas de pé, um alemão, o Lagerführer (líder do campo) se aproximou dos pessoas que estavam lá e posteriormente disse que quem tivesse fumado um cigarro deveria se entregar, caso contrário ele enforcaria 10 “cachorros”. Os presidiários eram frequentemente chamados dessa forma, pois eles tinham etiquetas com o seu número de identificação. Solomon era o número 993. Como ninguém respondeu ao Lagerführer, ele selecionou as pessoas que iriam para a forca. Solomon era um deles. Antes de subir no banco e colocar a corda no pescoço os prisioneiros ainda apanharam, deixando alguns deles ensanguentados. Nesse instante, um soldado se aproximou e intercedeu. Solomon descreve que “mais alguns segundos e eu teria sido morto. Ele (Lagerführer) precisava apenas ter chutado o banco”. Esse soldado que evitou a forca, estava encarregado de selecionar três grupos de 750 pessoas que seriam encaminhadas a outro campo para realizar trabalhos forçados. Solomon foi dos selecionados. Na manhã seguinte, Solomon saiu de Majdanek em uma viagem de trem que durou mais duas noites e um dia. Em nove semanas em Majdanek, ele recorda-se de não ter trocado sua camiseta ou ter sequer se banhado. Além disso, ele e os demais estavam com muitos piolho e famintos. Ao sair do vagão, eles viram que tinham chegado a Auschwitz. Houve uma seleção e ali mesmo algumas das pessoas foram fuziladas. Elas sequer foram enviadas para as câmaras de gás. Posteriormente, Solomon foi tatuado, recebendo o número de identificação 128232. Ele costumava comentar que o somatório destes números dava 18, que em hebraico aludem a guemátria da palavra “chai”, que significa vida. Após passar pela quarentena, ele foi enviado para trabalhar na construção de trilhos para a ferrovia. O kapo (chefe que supervisionava o serviço) era uma pessoa terrível. Ele costumava formar duplas para carregar as vigas de ferro colocando uma pessoa alta com uma baixa. Solomon, que era baixo, recorda-se que “o homem com quem eu trabalhei precisava dobrar os joelhos”. Certa vez, Solomon caiu e não conseguia se levantar. O kapo começou a gritar e bater nele, e o deixou de lado. Logo depois houve uma seleção e todos tiveram que tirar a roupa e ficar nus durante toda a noite. Na manhã seguinte, um caminhão com uma cruz vermelha veio, e eles foram empurrados um em cima do outro. O pensamento era de que eles estariam indo para as câmaras de gás. No entanto, eles foram levados de Auschwitz III para Auschwitz I. O complexo de Auschwitz consistia em Auschwitz I, Auschwitz II (também conhecido como Auschwitz-Birkenau ou Birkenau), Auschwitz III (Monowitz) e quarenta e cinco subcampos. Solomon foi encaminhado para o bloco 20, da área hospitalar, onde o doutor Josef Mengele (conhecido como “anjo da morte”) fazia suas seleções. Após ser alertado sobre os riscos de ficar naquele local, quando um soldado questionou se alguém daquele bloco se voluntariaria para fazer um trabalho em outra área Solomon se voluntariou prontamente. Ele seria encaminhado para trabalhar nas minas de carvão, no entanto outro judeu novamente lhe advertiu que o máximo que alguém era capaz de sobreviver neste trabalho era por apenas duas semanas. Então, contando com mais uma pitada de sorte ele acabou sendo encaminhado para outro trabalho, em uma mina de areia. Todos os dias ele e mais nove pessoas carregavam um vagão que levavam até Birkenau, onde usavam a areia para cobrir as cinzas que eram retiradas dos crematórios. Durante mais de um ano ele fez este trabalho, no qual era preciso caminhar aproximadamente 16 quilômetros por dia. A respeito das vivências de Salomon, enquanto ele trabalhava da mina de areia ele recorda-se de alguns episódios marcantes: “Eu via quando os transportes (trens) chegavam. Eu vi as pessoas que iam para a direita e para a esquerda. Eu via quem estava indo para as câmaras de gás. Eu via as pessoas que iam para os chuveiros reais. Em agosto e setembro de 1944 eu vi jogarem crianças vivas no crematório. Eles (os soldados) as agarravam por um braço e uma perna e as jogavam lá. Um sábado, quando estávamos a trabalhar, viramos e vimos um soldado com um rifle, então começamos a acelerar o passo. O soldado disse: ‘Devagar, hoje é o seu Shabat’. Ele era um húngaro, e disse: ‘Venha para o meu quartel às 4 horas, e eu vou ter algo para vocês. Eu vou colocar um balde com lixo nele. Olhe sob o lixo e você vai encontrar onze peças de pão.’ Por duas ou três semanas ele nos ofereceu. Ele nos pediu para trazer algum dinheiro, o que nós fizemos… um dia ele desapareceu.” Entre os dias 17 e 21 de janeiro os alemães estavam começando a liquidar Auschwitz, quando eles enviaram em poucos dias aproximadamente 56 mil presos para marchar. Muitos deles foram encaminhados para as cidades de Gleiwitz e Loslau, para que posteriormente fossem direcionados a outros campos de concentração em áreas mais protegidas dos exércitos aliados. Dia 18 de janeiro de 1945 foi quando Solomon saiu de Auschwitz, nove dias antes dos russos liberarem o campo. Solomon foi enviado para o campo de Gross-Rosen. Ele recorda-se de ter ficado em um galpão com dois mil homens. A única comida que eles recebiam era uma fatia de pão e um copo de café à noite. Lá ele achou que não iria sobreviver. Posteriormente ele ainda foi enviado para o campo de concentração de Dachau. Ele recorda-se que a viagem de trem foi bastante penosa, onde as pessoas precisaram comer neve, como uma forma de se hidratar, já que não havia nenhuma água para elas beberem. Durante a viagem ele ainda presenciou uma cena terrível, quando um jovem que havia enlouquecido acabou por enforcar seu próprio pai, levando-o à morte. Chegando em Dachau, foi feita uma seleção para separar as pessoas que estavam doentes das sadias. Solomon deixou o campo no dia 26 ou 27 de abril de 1945 e foi libertado no dia 1º de maio. Durante esse tempo eles viajaram em trens. Eles passaram pelas cidades de Tutzing, Feldafing e Garmisch, na região da Baviera, na Alemanha. Um dia eles ordenaram que os prisioneiros fossem para o outro lado da montanha. Os alemães haviam preparado uma armadilha e começaram a disparar com metralhadoras contra eles. Algumas centenas foram mortos enquanto corriam de volta para o trem. No dia seguinte, eles ouviram aviões soltando bombas. Logo depois, Solomon recorda-se de ter dito a si mesmo: “Eu acho que este é o fim. Depois de todos estes anos no gueto e perder todos, agora este é o fim. Quem é que vai sobrar para poder dizer Kadish para a minha família?”. Na madrugada seguinte um jipe parou onde eles estavam abrigados, no trem. Um dos soldados americanos, que sabia falar alemão perguntou quem eram eles. Quando eles disseram ser dos campos de concentração, o soldado imediatamente disse que eles estavam livres. Isso foi no dia 1º de maio de 1945. Solomon recorda-se ainda de ter recebido orientações de um dos militares americanos para ter cuidado com o que ele iria comer, pois seu estomago havia reduzido muito durante todo o período de aprisionamento. Ele foi enviado em liberdade, para a cidade de Feldafing, na Alemanha. Solomon Radasky casou-se em novembro de 1946. Sua esposa Frieda também era de Varsóvia e ele recordava-se de ter feito negócios com a família dela. Com essa proximidade, ele descreve que já havia um sentimento de família entre eles. “Nós viemos para Nova Orleans em 1949. Eu não sabia falar inglês. Eu fui para uma loja de peles e eles me deram pele e apontaram para uma máquina de costura. Eu costurei. Então apontaram para um quadro, para esticar as peles e lhes mostrei que eu poderia fazer isso. Eu também peguei uma faca e mostrei que eu poderia cortar. Eles me contrataram por 50 centavos por hora, mesmo que o valor para iniciantes fosse de 75 centavos por hora. Eu comprei uma máquina de costura por 50 dólares e comecei a receber trabalhos. Em seguida, fui contratado pela loja ‘Haspel Brothers’, onde fui capataz. Eu me desenvolvi, criamos e educamos nossos dois filhos. E depois de 28 anos Frieda e eu fizemos nossa primeira viagem de férias em 1978, para Israel”. Dia 2 de agosto de 2002 Solomon Radasky veio a falecer. Ele dizia que era muito importante contar sua história, pois a vida de quase todos os 375 mil judeus que viviam em Varsóvia antes da guerra acabaram sendo interrompidas pelo nazismo.

Frieda e Solomon Radasky
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