Eva Galler - Escapando do trem da morte
- futurasgeracoes1
- Nov 29, 2016
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Eva nasceu em Oleszyce, na Polônia, no dia primeiro de janeiro de 1924. Lá residiam aproximadamente 7.000 famílias, das quais quase metade era de judeus. Seu pai se chamava Israel Vogel e ele era o principal responsável pela comunidade judaica da cidade. Na ocasião de seu nascimento, ocorreu um incêndio que acabou por causar sérios danos na casa de um grande rabino, da chassidut de Belz, que morava naquela região - Yissachar Dov Rokeach. Ele recebeu diversos convites para ficar na casa de diversas famílias. Seu secretário pessoal acabou por decidir que o rabino deveria se estabelecer na casa de Israel Vogel, que era bastante ampla e poderia lhe acomodar. Naquela época Ita, a mãe de Eva, já havia perdido quatro filhos e eles deveriam ir morar em uma casa ao lado que também era da família. Ita recusou-se a mover o berço de Eva para fora da casa principal até o rabino lhe abençoasse. E ele ofereceu a aquela pequena criança uma bênção muito especial. Os judeus e os não-judeus da Oleszyce não costumavam se misturar socialmente, apenas nos negócios. Existia um antissemitismo muito forte que era sentido por todos. As crianças judias não eram autorizadas a participar de peças nas escolas; elas também sofriam ofensas das outras crianças e na Páscoa chegavam a ser alvo de pedras que lhes eram atiradas. Através dos jornais, a população estava ciente dos Nazistas e dos eventos que ocorriam da Alemanha. No entanto, de forma alguma eles imaginavam que Hitler poderia invadir a Polônia. Em um depoimento dado por Galler, ela relatou que “os soldados poloneses costumavam cantar canções patrióticas. Eles não iriam desistir de uma polegada do solo polonês até a última gota de sangue”. As pessoas não acreditavam que os alemães iriam invadir a Polônia, até que elas viram os aviões. Em poucos dias os alemães ocuparam todo o país. A Alemanha e a União Soviética tinham um tratado, de não agressão. Esse pacto dividiu a Polônia. Os alemães ocuparam toda a Polônia e em seguida, de acordo com o tratado, os soviéticos também assumiram parte do país. Até 1941, eram os soviéticos que tinham controle da cidade de Oleszyce. De acordo com Eva em junho de 1941, “por volta das 6 horas da manhã de um domingo, ouvimos tiros e saímos para ver o que estava acontecendo. Motociclistas alemães estavam descendo a rua principal. Os soldados estavam atirando para a direita e a esquerda. Quem estava na rua foi morto imediatamente. Aí foi, quando começaram os nossos problemas”. Rapidamente o cenário da cidade mudou. Os judeus passaram a usar braçadeiras com estrelas de David costuradas e começaram a fazer trabalhos forçados. Eva narrou um episódio marcante que ocorrera com sua mãe: “Nós não éramos autorizados a andar nas calçadas, tínhamos que caminhar no meio da rua. As ruas em nossa cidade não eram pavimentadas. Quando chovia, elas se tornavam ruas de lama. Uma vez minha mãe esqueceu e caminhou na calçada. Um jovem passou por ela, um rapaz ucraniano que era professor. Ele já havia ajudado meus irmãos com seus deveres de casa e até chegou a ir a nossa casa. Ele foi e bateu na minha mãe quando a viu caminhando na calçada. Minha mãe veio e chorou. Ela disse: ‘Se um alemão tivesse feito isso, eu não teria dito nada, mas este homem deveria ser uma pessoa inteligente: ele já chegou a entrar na minha casa e eu lhe dei de comer.’” Continuando seu relato, ela disse que ela não era capaz de entender bem aquela situação: “Eu me sentia degradada. Houve momentos em que eu invejava um cão. Um cão tem seu mestre que lhe dá cuidados e o alimenta. Nós estávamos fora da lei. Qualquer um poderia fazer o que quisessem com a gente.” Certa vez os alemães organizaram uma grande fogueira no centro da cidade, com todos os livros de reza e rolos de Torá. As três sinagogas de Oleszyce também foram queimadas. Em setembro de 1942 todos os judeus que viviam em Oleszyce e arredores foram forçados a marchar sete quilômetros até Lubaczow, onde eles foram confinados em um gueto. O gueto de Lubaczow era do tamanho de um quarteirão e lá tinham aproximadamente 7.000 pessoas. “Era como uma caixa de sardinha. As pessoas viviam em sótãos, em porões, nas ruas - por tudo. Tivemos a sorte de ter um teto sobre nossas cabeças”, relembra. A situação era tão extrema que algumas pessoas procuravam se alimentar com grama. Em tais condições, onde o ambiente era insalubre, o acesso a água e alimento eram escassos, era comum a proliferação de doenças e todos os dias inúmeras pessoas perdiam suas vidas em decorrência da deterioração de suas saúdes. Em janeiro de 1943, a Gestapo e as polícias polonesas e ucranianas começaram a encaminhar os judeus do gueto para os campos de concentração. Eva chegou a relatar que eles sabiam o que deveria se suceder. Um rapaz que era da mesma cidade que ela havia sido encaminhado anteriormente para o campo de Belzec, de onde conseguira escapar. Ao retornar para a cidade, ele disse que em Belzec havia um crematório. Além disso, algumas pessoas que trabalhavam forçadamente perto dos trilhos recolheram alguns bilhetes que eram jogados pelas pessoas confinadas nos trens que passavam por ali. Os judeus do gueto foram então encaminhados para vagões que costumavam ser utilizados para transporte de gado. As pessoas que tentavam fugir eram baleadas. Ao entrar no trem, todos precisavam ficar de pé, pois não havia lugar para se sentar. Um menino que estava no mesmo vagão que Eva conseguiu romper os arames farpados da janela do trem. Os jovens começaram a saltar para fora da janela. Os soldados da SS que estavam no telhado do trem passaram a atirar contra eles com seus fuzis. Então Israel disse a seus três filhos mais velhos: “Corram, corram - talvez vocês fiquem vivos. Nós vamos ficar aqui (no trem) com as crianças pequenas, porque mesmo que elas consigam fugir elas não serão capazes de sobreviver.” Para Eva, ele ainda disse: “Eu sei que você ficará viva. Você tem a bênção de Rebe de Belz.” Berele e Hannah foram os primeiros a pular, seguidos por Eva. Os soldados atiraram. Eva não foi atingida e caiu em um monte de neve. Quando ela já não ouvia mais nada foi procurar por seu irmão e irmã. Eles estavam mortos. Berele tinha 15 anos e Hannah tinha 16. Eva, na ocasião, tinha 17 anos. Ela tirou sua braçadeira e caminhando pela floresta foi até Oleszyce. Chegando na cidade conseguiu abrigo por algumas horas nas casas de duas senhoras. Por receio de serem descobertas ajudando a uma judia, essas senhoras pediram que Eva fosse embora. Uma delas chegou a lhe entregar um pouco de dinheiro e um pedaço de pão. Galler queria ir para uma estação de trem, mas com medo de ser reconhecida em Oleszyce, ela decidiu caminhar pela floresta até a próxima estação, que ficava a aproximadamente 30 quilômetros de distância, na cidade de Jaroslaw. Lá ela comprou uma passagem para Cracóvia. Ao chegar na Cracóvia, sem dinheiro e sem comida, Eva não viu outros judeus circulando pela cidade e como estava receosa de perguntar para alguém onde ficava o gueto, ela acabou por ser encontrada pelas autoridades com outros jovens que eram órfãos, e na ocasião eles presumiram que ela não era judia. Ela passou por uma inspeção física e posteriormente assumiu uma nova identidade, que acabou por inventar: Katarzyna Czechowska, polonesa, nascida dia 12 de maio de 1924. Posteriormente Galler foi enviada para um mercado em Viena, onde agricultores alemães iam para pegar trabalhadores. Era algo como um mercado de escravos, pois ninguém queria ir espontaneamente trabalhar na Alemanha nazista. Ela acabou em uma fazenda na região dos Sudetos, na fronteira germano-checoslovaca e trabalhou lá por um ano antes de ser transferida para outra fazenda. Quando a guerra chegou ao fim, Eva voltou para a Polônia e constatou que de toda a cidade de Oleszyce apenas 12 judeus haviam sobrevivido. Ela se reencontrou com Henry Galler, que era um amigo de infância com quem acabou por casar. Eles se mudaram para a Suécia em 1946 e viveram lá por 8 anos. Em 1954 o casal emigrou para os Estados Unidos. Ao todo eles tiveram três filhas. Em um depoimento, Eva disse que a princípio ela não tinha pretensão de falar sobre a guerra, mas eventualmente cedeu a pressão de seus filhos e então ela e seu marido passaram a visitar escolas para contar sua história aos alunos. Eva veio a falecer no dia 05 de janeiro de 2006, na cidade de Dallas, nos Estados Unidos.

Katarzyna Czechowska foi a identidade fictícia assumida por Eva Galler para esconder sua origem judaica

Eva Galler aos 14 anos de idade
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